Mineradora vai produzir ferro no centro-sul da Bahia

Começa a sair do papel o projeto da Greystone Mineração, que vai produzir ferro em Urandi, município do centro-sul da Bahia, na divisa com Minas Gerais. O termo de referência para elaboração do Estudo de Impacto Ambiental (EIA) e do Relatório de Impacto Ambiental (RIMA) foram aprovados pelo Instituto do Meio Ambiente e Recursos Hídricos (INEMA).

O EIA/RIMA é uma exigência do processo de licenciamento ambiental. As informações necessárias para elaboração dos documentos devem ser coletadas por empresas independentes, contratadas pela mineradora. Dentre os dados que serão levantados estão as consequências do empreendimento para o meio-ambiente, bem como medidas necessárias para minimizar esse impactos.

Sediada em São Paulo (SP), a Greystone consta na Receita Federal como empresa originária da Malásia. Olho Público apurou que a empresa não possui operações de mineração ativas no Brasil. No entanto, a empresa adquiriu, entre 2020 e 2021, onze áreas para pesquisa mineral na Bahia, por meio de leilão realizado pela Agência Nacional de Mineração.

Com 24 anos de atraso, CERB contrata pesquisa para detectar urânio em água

Pesquisa que será realizada por empresa contratada pela Companhia de Engenharia Ambiental e Recursos Hídricos da Bahia (CERB) vai detectar se há presença de urânio em 30 amostras de águas subterrâneas na Bahia. O termo de referência do contrato da licitação vencida pela Bioagri Ambiental não informa onde serão coletadas essas amostras. Olho Público solicitou essa e outras informações à assessoria de comunicação da CERB, mas não obteve resposta.

Olho Público aposta que as amostras que poderão conter vestígios do mineral radioativo serão coletadas na Província Uranífera de Lagoa Real, área de 1.200 quilômetros quadrados, distribuída entre Caetité, Lagoa Real e Livramento de Nossa Senhora. É naquela região que acontecem as atividades de mineração e beneficiamento de urânio da estatal Indústrias Nucleares do Brasil (INB), ligada ao governo federal. O urânio da Bahia é matéria-prima do combustível nuclear fabricado pela Marinha em Resende (RJ).

O blog atribui o silêncio da CERB ao fato de que em 2013 a estatal construiu uma cisterna para água destinada ao consumo humano em Caetité, supostamente sem saber que o urânio presente naturalmente no solo daquela região pode contaminar a água de origem subterrânea. Foi a INB que detectou a contaminação na cisterna aberta pela CERB, mas a estatal federal demorou sete meses para alertar a prefeitura de Caetité, que lacrou o poço.

Ambientalistas sustentam que a presença de urânio na água de Caetité, em nível seis vezes maior do que a legislação permite, foi causada pelas atividades da INB. No entanto, levantamento feito por Olho Público revela realidade diferente: a pesquisa que acaba de ser contratada pela CERB deveria ter sido feita há 24 anos. A CERB não poderia ter desconsiderado o risco de contaminação das águas subterrâneas em Caetité e Lagoa Real, pois esse fenômeno já era conhecido na década de 1990.

Informação pública

Em 1997, para embasar o pedido de licença ambiental imprescindível para o início de suas operações, a INB contratou uma empresa independente para elaborar um Relatório de Impacto Ambiental (RIMA). Esse documento é importante porque descreve, para uma determinada região, o estado dos diversos aspectos ambientais – incluindo a água – antes da instalação de um empreendimento.

O RIMA e demais documentos do processo de licenciamento ambiental são públicos e ficam disponíveis no site do Ministério do Meio Ambiente, no caso dos licenciamentos que dependem de aval federal. O RIMA da INB contém a informação de que a presença de urânio na região de Caetité ocorre em faixas de solo com profundidades entre um e 25 metros. A CERB desconsiderou essa e outras informações que Olho Público destaca nessa matéria.

Elaborado pela empresa Planarq, o RIMA da INB afirma que “alguns pontos de monitoramento de águas subterrâneas – poços artesianos, cacimbas, cisternas etc” apresentavam, em 1997, “teores de rádio demasiadamente elevados”. Citando dados do Ministério da Saúde, o relatório diz que a incidência de neoplasias naquela região era 28% maior do que na área de controle, formada por Mairi, Mundo Novo e Ruy Barbosa.

Câncer raro

A inexistência, na região de controle, de casos de câncer do encéfalo, distúrbio apontado pelo RIMA da INB como “bastante raro” e “bom indicador de dano radioativo” é outro dado que sugere que contaminação por urânio é um fenômeno natural e, portanto, anterior ao início da chegada da INB. No período de referência para o relatório, ocorreram quatro casos de câncer do encéfalo na região da Província Uranífera.

Antes de 2013, ano em que a CERB perfurou a cisterna contaminada, já existiam estudos científicos na Bahia relacionando a ocorrência natural de urânio à incidência de doenças. Um desses trabalhos, feito por pesquisador da Faculdade de Medicina da UFBA, revela que entre 1980 e 2010 a tendência de desenvolver câncer do intestino entre moradores de Caetité com mais de 50 anos (50,52%) era muito maior do que a média geral da Bahia (2,62%).

Acúmulo no organismo

Utilizando dentes humanos como indicadores, pesquisa divulgada em 2007 pela Universidade Estadual de Santa Cruz (UESC) descobriu que o índice de incorporação de urânio no organismo de moradores de Caetité é 25 vezes maior do que a do grupo controle (moradores da área da represa de Guarapiranga, em São Paulo) e 100 vezes maior do que a média mundial.

Olho Público perguntou à CERB se a análise que será feita agora é o primeiro monitoramento da presença de urânio em águas subterrâneas feito por iniciativa da estatal baiana, mas não houve resposta. Não foram encontradas evidências de que a CERB já tenha feito essa análise.  Embora a cisterna contaminada tenha sido aberta pela CERB, a análise que confirmou o laudo da INB foi feita pelo Instituto do Meio Ambiente e Recursos Hídricos (INEMA).

Se a CERB tem poder e orçamento para contratar esse tipo de pesquisa, por que não fez isso antes de sair perfurando cisternas na região de Caetité? Se esse dado estivesse disponível naquela época, confirmando o que o RIMA da INB e trabalhos científicos sinalizavam, já poderia ter sido tomada alguma solução para evitar que a população daquela região continue ingerindo e utilizando água com urânio.