Sem alarde, órgãos de segurança contratam ferramentas para “hackear” celulares

Duas secretarias do governo da Bahia investiram quase um milhão de reais na aquisição de softwares para extrair dados de smartphones, tablets e outros dispositivos de comunicação. Olho Público não conseguiu identificar exatamente a capacidade desses programas, mas pelo perfil das empresas é possível ter uma ideia das funcionalidades.

O fornecedor da Secretaria de Segurança Pública da Bahia (SSP) é a TechBiz Forense Digital, que se apresenta como “maior integradora da América Latina de soluções de investigação em meios digitais”. Exército, Marinha e Polícia Federal também são clientes da empresa sediada em Belo Horizonte (MG).

Entre os produtos oferecidos pela TechBiz há uma ferramenta que permite “busca instantânea, rastreamento e captura de dados no vasto conteúdo de sites como Facebook, Twitter, LinkedIn, YouTube, entre outros”. Outro software comercializado pela empresa promete “acesso imediato e extração de dados privados baseados na nuvem, sejam eles oriundos de mídias sociais, webmail e armazenamento na nuvem”.

A TechBiz também fornece equipamentos para recuperação de senhas de celulares, computadores, arquivos e unidades de armazenamento, bem como um “supercomputador comercialmente acessível” que pode ser utilizado para abrir arquivos criptografados. O valor do contrato da SSP com a TechBiz é de R$ 703 mil.

Presídios

Com um investimento menor do que o da SSP, a Secretaria de Administração Penitenciária e Ressocialização (SEAP) também adquiriu “soluções para extração de dados em equipamentos móveis”, fornecidas pela empresa paulista Apura Cybersecurity Intelligence.

A Apura, que se apresenta como “empresa 100% brasileira”, tem um leque de soluções parecido com o da TechBiz. Nove secretarias estaduais de segurança pública – incluindo a da Bahia – são clientes da Apura, que também é fornecedora da Kroll, multinacional que presta serviços de investigação empresarial.

Considerando o valor investido (R$ 294 mil) é muito provável que a SEAP tenha priorizado a aquisição de ferramentas para extrair dados de celulares apreendidos em presídios da Bahia.

O destino dos dados capturados pela SSP e pela SEAP pode ser o laboratório de tecnologia contra lavagem de dinheiro (LAB-LD) ou o laboratório de tecnologia contra crimes cibernéticos (CIBER-LD), que recentemente foram transferidos da Superintendência de Inteligência da SSP para a estrutura da Polícia Civil.

Novos veículos

A estrutura de inteligência da Secretaria de Segurança Pública da Bahia (SSP) também foi reforçada com a aquisição de dois veículos do tipo van, fornecidos pela Fiat, pelo valor total de R$ 294 mil.

Olho Público não teve acesso ao modelo dos veículos adquiridos, mas aposta que eles são de cor preta e com vidro fumê, no tom mais escuro possível. Considerando isso, fica o alerta: se você fez alguma coisa errada que deixou rastro na internet, espere pelo pior se uma van preta com vidro fumê aparecer perto da sua casa ou do seu local de trabalho. A polícia está de olho em você e já sabe tudo da sua vida…

SEAP retoma licitações para operação dos presídios de Brumado e Irecê

As licitações para contratação de empresas para a cogestão dos presídios e Brumado e Irecê, que estão sem funcionar desde a inauguração, há cinco anos, foram retomadas pela Secretaria de Administração Penitenciária e Ressocialização da Bahia (SEAP), conforme avisos publicados hoje (6 de abril) na imprensa oficial. O andamento dos dois certames estava suspenso em virtude da pandemia de COVID-19.

O valor estimado dos contratos é de R$ 54 milhões (Brumado) e R$ 51 milhões (Irecê). Os dois presídios terão o mesmo número de vagas (531). A abertura dos envelopes com as propostas acontecerá sexta-feira (9 de abril), na sede da SEAP (CAB), em Salvador.

A razão dos dois presídios estarem parados há cinco anos é um impasse judicial envolvendo a terceirização da função de policial penal. Por se tratar de carreira de estado, essa atividade deve ser exercida por aprovados em concurso público. A manutenção de agentes terceirizados para os presídios baianos que já operam em regime de cogestão foi permitida por uma liminar do Supremo Tribunal Federal (STF), até que um novo concurso seja realizado.

Conforme noticiado por Olho Público, a contratação das empresas que farão a cogestão dos presídios de Brumado e Irecê poderá sofrer intervenção do Ministério Público Federal (MPF). No mês passado, um representante do Sindicato dos Servidores Penitenciários do Estado da Bahia (SINSPEB) fez uma representação junto ao MPF em Salvador solicitando o cancelamento das duas licitações.

Justiça nega reincorporação de policial que matou guarda municipal

O ex-soldado PM André Novais de Almeida, condenado pelo assassinato de seu sobrinho, Daniel Almeida, que tinha 29 anos, não conseguiu liminar da Justiça Militar da Bahia para ser reintegrado à Polícia Militar. A decisão, proferida pelo juiz Horácio Moraes Pinheiro na última quinta-feira, só foi divulgada hoje (31 de março).

O crime que levou André a ser condenado por quatro anos de prisão, cumpridos inicialmente em regime semiaberto, aconteceu em outubro de 2011, em Itapetinga. Daniel foi morto a tiros, na porta de sua residência. O caso teve grande repercussão na Bahia. Daniel, que era guarda municipal, trabalhava como DJ nos dias de folga, animando festas de aniversário e outros eventos.

André foi demitido da PM em fevereiro deste ano, após a conclusão de um processo administrativo iniciado em janeiro de 2012, mas que só foi concluído em junho de 2014. Em seu pedido de reintegração, o ex-soldado alegou que a “demora excessiva” no andamento do processo administrativo teria provocado a prescrição do caso.

A ação penal contra André Novais de Almeida já transitou em julgado. Embora tenha sido condenado a quatro anos de prisão, cumpridos inicialmente em regime semiaberto, a pena prevista para o crime praticado pelo ex-soldado era de 12 anos, condição que levou o juiz a afirmar que a prescrição só ocorrerá após um intervalo de 20 anos. A defesa de André alega que esse prazo é menor, e que deveria ser proporcional à pena de quatro anos.

Cartório de tabelião suspeito de feminicídio está sob intervenção

O Tabelionato de Protesto de Títulos da Comarca de Feira de Santana, que tem como delegatário Éden Márcio Lima de Almeida, suspeito de matar a bancária Selma Regina Vieira da Silva, em 2019, está sob intervenção. A suspensão aplicada a Éden é decorrente de um processo administrativo do Tribunal de Justiça da Bahia (TJ-BA). Para não comprometer as atividades naquele cartório, foi designada uma interventora.

Olho Público não conseguiu confirmar se essa decisão tem relação com a ação penal na qual Éden é réu, pois os códigos dos processos criminal e administrativo não informam resultado, situação comum em questões com sigilo decretado pela Justiça. No entanto, a Lei nº 8.935 (Lei dos Cartórios) prevê que um tabelião pode ser afastado para “apuração de faltas imputadas”.

A interventora designada pelo TJ-BA é Flávia Costalonga Ramos, oficiala titular do Tabelionato de Protesto de Títulos da Comarca de Alagoinhas. Pela condição de interventora, Flávia receberá 30% da renda bruta dos emolumentos do Tabelionato de Protesto de Títulos de Feira de Santana.

Por determinação do TJ-BA, Éden receberá 50% da renda líquida do cartório de Feira de Santana. O restante será depositado em conta bancária especial. Se for absolvido, Éden receberá esse montante, com correção monetária. Se for condenado, os valores depositados ficarão com a interventora.

Prisões revogadas

A prisões de Éden e de sua amante, Anna Carolina Lacerda, foram revogadas no final de fevereiro. Desde então, nenhuma informação sobre este caso foi noticiada. Como Olho Público não pode acessar o processo, foi feito um pedido de informações à Secretaria da Segurança Pública da Bahia (SSP-BA) para verificar se há mandado em aberto contra o casal. Se a SSP-BA responder, Olho Público atualizará essa matéria.

De acordo com a denúncia feita pelo Ministério Público da Bahia, Selma, que era casada com Eden, morreu após ter sido espancada pelos dois suspeitos, em um apartamento do marido, em Salvador. Na ocasião da denuncia, o promotor responsável pelo caso afirmou que Eden, Selma e Anna Carolina formavam um triângulo amoroso.

Apesar de ter ocorrido em 2019, a morte de Selma Regina Vieira da Silva só foi denunciada dois anos depois. O promotor responsável pelo caso atribuiu essa demora a uma suposta proteção dada pela polícia a Éden Márcio Lima de Almeida, afirmação que que foi rejeitada pela Ordem dos Advogados do Brasil (OAB).

Operação Faroeste: despachos revelam desconforto de juiz com processos

A Operação Faroeste continua provocando mal-estar no Judiciário da Bahia. Levantamento feito por Olho Público em processos que continuam tramitando na Comarca de Formosa do Rio Preto revela que o trabalho do juiz tem sido marcado por sinais de desconforto e cautela. Em alguns casos, o magistrado prefere adiar a tomada de decisões, com a justificativa de que esses processos devem ser analisados com cuidado redobrado.

Em despachos publicados neste mês pela 1º Vara dos Feitos Relativos às Relações de Consumo, Cíveis e Comerciais, de Formosa do Rio Preto, o tema da Faroeste é referenciado como um “imbróglio” “relativo a questões possessórias e dominiais de terra”.

No início do mês, ao julgar um pedido de tutela na disputa da fazenda São José, epicentro das investigações que detonaram a Operação Faroeste, o juiz afirmou que aquele processo “é um dos mais emblemáticos da Comarca de Formosa do Rio Preto”. “Quando se faz ligação de questões atuais com este, a cautela deve ser redobrada, sob pena de se decidir, questões já decididas ali”, escreveu o magistrado.

Em outras duas ocasiões, o juiz declarou-se suspeito “por questão de foro íntimo” para proferir decisões envolvendo “processos que, de alguma forma, tenham conexão com estas e com a Operação Faroeste”. Em pelo menos cinco ocasiões, o magistrado determinou que todos os processos relacionados à Faroeste fossem automaticamente remetidos ao juiz substituto.

Deflagrada em 2019, a Operação Faroeste revelou o envolvimento de pessoas ligadas ao Tribunal de Justiça da Bahia em um suposto esquema de grilagem e venda de sentenças, entre outros crimes. A operação resultou em prisões de desembargadoras e no afastamento do secretário de Segurança Pública da Bahia.


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