Um dado importante não foi devidamente percebido, após o alerta feito no início da semana pela Secretaria de Agricultura, Pecuária, Irrigação, Pesca e Aquicultura da Bahia (SEAGRI). A monilíase, doença que afeta plantações de cacau, é considerada pela EMBRAPA como praga “de elevado poder de destruição”.
Em 2018, o então diretor-presidente da Comissão Executiva do Plano da Lavoura Cacaueira (CEPLAC), Guilherme Galvão, deu declarações à imprensa afirmando que se o fungo da monilíase chegasse ao Brasil, “seria um caos”. Ele também afirmou que a praga tem potencial para causar impacto equivalente ou pior do que o da “vassoura de bruxa”, que dizimou a lavoura de cacau da Bahia na década de 1980.
Contra a vassoura de bruxa já existem defensivos que reduzem em até 90% o impacto nos cacaueiros. Clones mais resistentes à praga, desenvolvidos em laboratório, também ajudaram a controlar a vassoura de bruxa na Bahia. Para a monilíase ainda não há técnica de controle eficaz.
A alerta da SEAGRI ocorre após a constatação dos primeiros casos de monilíase no Brasil, identificados no Acre, ao final de junho. Antes de chegar ao Brasil, o fungo percorreu um longo caminho, começando pelo Equador, em 1917. O Brasil era o único produtor de cacau latino-americano que não registrava casos de monilíase.
Abandono do cultivo
Tese de doutorado de 2004, apresentada à Universidade Federal de Viçosa (MG) pelo fitopatologista peruano Rolando Alfredo Rios-Ruiz, revela que na Costa Rica e no Equador, a monilíase provocou perdas de até 90% nas lavouras cacaueiras. No Equador houve “total abandono do cultivo”.
“Pode levar a perdas severas rapidamente e gerar problemas econômicos e sociais, como ocorreu com a VB (vassoura de bruxa) que atingiu a Bahia em 1989”, alerta Rios-Ruiz.
Em 2018, a CEPLAC criou o Grupo Nacional de Emergência Fitossanitária para Monilíases. Há dois anos, foi anunciado o Plano Nacional de Prevenção e Vigilância de Moniliophthora roreri (fungo causador da doença). Agora chegou a vez da Bahia se preparar para barrar a praga, o que não aconteceu com a vassoura de bruxa.
A Bahia responde por 70% da produção nacional de cacau, que em 2019 atingiu 130 mil toneladas. Dez por cento da produção é perdida para a vassoura de bruxa. Em março, a CEPLAC anunciou que pretende aumentar a produção anual de cacau em 60 mil toneladas, nos próximos quatro anos.
Olho Público conversou com produtores de cacau e entidades que representam empresas que processam o produto na Bahia. Na semana que vem, o blog vai reproduzir os anseios e expectativas de pessoas e empresas que correm risco de terem seus negócios afetados por crise semelhante ou pior do que a da vassoura de bruxa.