Porto Seguro vai ensinar “tratamento precoce” a Salvador?

Há poucos dias, as prefeituras de Salvador e de Porto Seguro assinaram termo de cooperação para compartilhamento de experiências em saúde. Como o aviso na imprensa oficial é genérico, Olho Público questionou à Casa Civil da Prefeitura de Salvador se o acordo envolve questões relacionadas à COVID-19 e àquilo que se conhece como “tratamento precoce”.

A razão desse questionamento é o fato de que a secretária da Saúde de Porto Seguro, que é parte no termo de cooperação, é defensora ferrenha do “tratamento precoce”. Raissa Soares, que é médica, divulga vídeos e outros conteúdos em redes sociais defendendo o uso de medicamentos comprovadamente ineficazes contra a COVID-19.

Em fevereiro, a prefeitura de Manaus aderiu ao “tratamento precoce” defendido por Raíssa Soares. O impacto desastroso da pandemia na capital amazonense sugere que o empirismo não reduziu a fila de leitos de UTI, tampouco zerou as internações por COVID-19 em Porto Seguro, informação desmentida por agências de checagem de fatos.

Olho Público procurou insistentemente as assessorias de comunicação da Casa Civil da Prefeitura de Salvador e da Secretaria da Saúde para saber se a troca de experiências com a Prefeitura de Porto Seguro envolve o “tratamento precoce” da COVID-19, mas não obteve resposta. É esperar para ver (ou não).

Kit intubação: SESAB omitiu risco de desabastecimento

Não surpreende Olho Público a informação publicada ontem (15 de abril) pelo site Bahia Notícias de que a Secretaria da Saúde do Estado da Bahia (SESAB) só tem estoque dos medicamentos que compõem o kit intubação para mais 15 dias.

Desde 22 de março, Olho Público vem cobrando da SESAB um posicionamento transparente sobre essa questão, mas as respostas sempre afastaram o risco de desabastecimento. A insistência de Olho Público nesse questionamento tem dois motivos.

O primeiro deles é o acompanhamento feito pelo blog do sistema estadual de compras, que evidenciou o agravamento da dificuldade da SESAB em obter o kit intubação. Para alguns medicamentos, foram feitas três licitações consecutivas que não atraíram fornecedor.

Em um intervalo menor do que um mês, essas tentativas de compra viraram dispensas de licitação, que viraram compras emergenciais.

No último sábado (10 de março), conforme noticiado por Olho Público, a SESAB avisou aos fornecedores que aceita receber os medicamentos do kit intubação em qualquer quantidade.

Ontem (15 de março) foi declarada deserta licitação para compra do anestésico propofol, que até pouco tempo era adquirido sem dificuldades. Esse fato pode ser indicativo de que mais um medicamento do kit intubação virou item escasso no mercado.

Alerta à sociedade

O segundo motivo que levou Olho Público a cobrar da SESAB uma resposta clara sobre os estoques do kit intubação é a convicção de que essa informação deve ser passada à sociedade da mesma forma como é comunicado, como sinal de alerta o nível de ocupação das UTIs.

Olho Público sabe que a escassez de medicamentos do kit intubação é um problema nacional que agrava a crise provocada pela COVID-19. Mas se todas as tentativas para repor o estoque foram esgotadas, a SESAB precisa ser transparente, pois isso coloca mais pressão na questão do atendimento hospitalar.

Não adianta ter leitos de UTI disponíveis se não há como intubar pacientes de forma minimamente confortável por falta de medicamento. As pessoas precisam ser alertadas sobre isso. E a SESAB tem que considerar isso como oportunidade de reforço às campanhas de adesão às medidas de prevenção.

Pandemia obriga município baiano a ampliar cemitério

Em virtude do aumento na demanda de óbitos provocado pela pandemia de COVID-19, a prefeitura de Santo Antonio de Jesus vai ampliar o número de vagas no cemitério municipal, localizado no bairro Quitandinha. Uma licitação foi lançada para contratar empresa que vai construir 608 gavetas funerárias, obra com valor estimado em R$ 293 mil.

“Tendo em vista a atual circunstância de pandemia de COVID-19, com a possibilidade de mortes simultâneas em número maior que o habitual e subsequente necessidade expressa de sepultamento, faz-se necessária a construção de novos módulos de gavetas funerárias no cemitério municipal de Santo Antonio de Jesus, onde no momento há pouca disponibilidade das mesmas”, detalha o edital da licitação.

Com uma população de 102 mil habitantes, Santo Antonio do Jesus registra 8.865 casos confirmados de COVID-19 e 95 óbitos provocados pela doença, segundo dados da Secretaria da Saúde da Bahia (SESAB) atualizados até ontem (14 de abril).

Santo Antonio de Jesus é um dos 37 municípios baianos onde o coeficiente de incidência da COVID-19 para 100 mil habitantes está acima de 8 mil. Em Salvador, que possui a maior quantidade de casos confirmados e óbitos entre todos os 417 municípios da Bahia, esse coeficiente é de 6.317. O maior coeficiente é o de Itororó, com 14.606 casos para 100 mil habitantes.

Pesquisa vai detectar se há novas mutações do vírus da COVID-19 na Bahia

Localizado em Salvador, o Laboratório Central de Saúde Pública (LACEN) fará nova investigação das amostras com resultado positivo para COVID-19 coletadas na Bahia. Um dos objetivos desse trabalho é verificar o surgimento de variantes do vírus SARS-CoV-2.

Desde que começou a realizar o sequenciamento genético do agente causador da COVID-19, o LACEN já detectou pelo menos 13 variantes em circulação na Bahia, entre elas a de Manaus e a da África do Sul, ambas com maior potencial de disseminação.

Olho Público perguntou à Secretaria da Saúde do Estado da Bahia (SESAB) quando esse trabalho será concluído, mas ainda aguarda resposta. A investigação envolve dados de sequenciamentos genéticos feitos por laboratórios públicos estaduais, mas também prevê a participação de laboratórios privados, mas sem custo para a SESAB.

Se uma nova variante for detectada, a divulgação da descoberta precisa seguir um protocolo estabelecido pela Diretoria de Vigilância Epidemiológica, que só fará o anúncio oficial após realização de investigação clínica, epidemiológica e laboratorial.

Risco de escassez do kit intubação gera clima de tensão para médicos

As secretarias estadual e municipal (Salvador) da Saúde tentam, sem sucesso, adquirir medicamentos utilizados no processo de intubação de pacientes em UTI, o chamado “kit intubação”. Em algumas situações, as licitações já foram publicadas por três vezes seguidas, sem atrair fornecedores. Especialistas consultados por Olho Público afirmam que a falta desses medicamentos pode trazer insegurança para médicos e enfermeiros.

Desde o início de suas atividades, há pouco mais de um mês, Olho Público vem tentando obter informações da Secretaria da Saúde do Estado da Bahia (SESAB) sobre os estoques do kit intubação. A resposta enviada pela SESAB, de que não há risco de desabastecimento, reflete realidade diferente daquela que se vê no sistema de compras da administração estadual.

Na última sexta-feira (10 de abril), a SESAB abriu dispensa emergencial para comprar de uma só vez grande quantidade (110 mil ampolas) de midazolam. Esse sedativo é o medicamento do kit intubação mais procurado por governos estaduais e municipais. No aviso da dispensa emergencial há uma ressalva: se o fornecedor não tiver o volume indicado, a SESAB aceita receber qualquer quantidade do midazolam.

Outros medicamentos do kit intubação que a SESAB vem tentando comprar em grande número são os bloqueadores neuromusculares cisatracúrio (90 mil unidades), pancurônio (120 mil unidades) e rocurônio (120 mil unidades). Essas quantidades destoam dos pedidos feitos para outros medicamentos do kit intubação, como propofol (sedativo) e fentanila (analgésico), frequentemente solicitados em lotes de até 10 mil unidades.

A Secretaria da Saúde do Salvador, que também foi questionada por Olho Público, corre atrás de midazolam, dextrocetamina, rocurônio, atracúrio (bloqueador neuromuscular) e lidocaína, anestésico que pode entrar no kit intubação, para suprir a falta de outros medicamentos. Recentemente, a Prefeitura de Salvador prorrogou a cotação de preço para 5 mil ampolas de rocurônio.

Médicos anestesiologistas e intensivistas consultados por Olho Público afirmam, na condição de anonimato, que os medicamentos do kit intubação podem ser substituídos por substâncias equivalentes ou soluções alternativas, como é o caso da lidocaína. No entanto, essas trocas podem implicar na modificação de procedimento padrão, uma situação indesejável em momento de grande demanda em UTIs.

Na prática, a mudança de padrões cria tensão e insegurança para médicos e enfermeiros que já estão acostumados a utilizar o mesmo conjunto de medicamentos no processo de intubação. Algumas adaptações demandarão estudo e supervisão por parte de médicos mais experientes e mais habituados em lidar com uma gama maior de medicamentos.